sábado, 19 de agosto de 2017

FALA ÁFRICA... MACVILDO PEDRO BONDE

FICÇÃO POLICIAL, UMA AVENTURA INICIÁTICA

Ao Óscar Fanheiro 

Maputo, vinte e sete de Julho de 2017 

Meu caro, espero que estejas a gozar bem as férias e que a saúde lhe empreste parte do seu encanto. A cidade continua sorridente, acomodada o inverno que chora na janela das acácias. 

Não te fies em mim. Podes perder o rumo do silêncio. Eu ando distante dentro de mim, colho rosas num campo de espinhos rendilhados de oiro. Às vezes, a noite afasta-se das minhas costas, pelo calor da chama ausente. Solitário na varanda do mundo, espalho nas paredes cansadas pelo tempo, bocados de risos que se libertam de mim. As cores amordaçadas pelo tempo ignoram a minha presença, cogitam com os voadores que acasalam com a lamparina, no quarto escuro, outras formas de amar. 

Não sigas o meu caminho. Procure na escuridão da alvorada os pingos azuis do mar, navegue na orla do desejo que cai dos teus olhos. Finge correr ao sol, dance nas cordas invisíveis da língua. Eu escuto a voz da fome; sinto o calor do toque dos pés que abraçam a maresia no inverno. 

Quando encontrares o silêncio, siga o rastro dos seus tentáculos, escute o ardor da sua voz, embaciada, fatigada pela tristeza nos cantos da boca. Ali terás a porta aberta; o vácuo onde a poesia e a prosa deixaram o embalo do verso.
Quanto, às crónicas que ando a escrever em delírio resultam de um processo experimental. Poderei abandoná-las do mesmo modo que tingi as primeiras palavras no banco de um jardim improvável. 

Continue nessa tua procura da ficção policial. Uma aposta assertiva se puderes beber devagarinho a técnica dos mestres. Mas, meu caro, advirto desde já que a estrada é larga e o Sol ardente. Não haverá sombra que albergue os teus dias maus e as tuas lágrimas poderão cair desamparadas num vale onde os crocodilos famintos aguardam pela carne fresca.

Espero que anoiteça de repente para que o sol não lhe deixe torrado.



M.P.Bonde

Sem comentários:

Enviar um comentário

Toca a falar disso